Fé, foco e disciplina?
Por Honório de Medeiros
Os livros de autoajuda, rico filão explorado à exaustão por alguns espertos em cima da ingenuidade de muitos, ensina que fé, foco e disciplina são a chave para o sucesso.
Fé, ou seja, crer que depende de nós chegar lá, naquele lugar almejado; foco: ficarmos circunscritos ao objetivo, à meta a ser alcançada, evitando decididamente qualquer distração que nos faça perder o rumo; disciplina, por fim, significando aquela entrega de corpo e alma, em termos de esforço, de dedicação, de renúncia, fundamentalmente necessários para se alcançar o sucesso em qualquer empreitada.
Nada mais, nada menos.
No entanto, segundo as mais recentes pesquisas em neuropsiquiatria, realizadas obsessivamente por cientistas ao redor do mundo, aliadas ao conhecimento adquirido em áreas tão diversas quanto matemática, teoria da seleção natural e estatística, demonstram que tudo isso é, em uma medida para lá de razoável, pura balela. O que existe, mesmo, é o acaso, aquilo que o senso comum chama de “sorte”.
É o que se lê no livro “O Andar do Bêbado”, de Leonard Mlodinow, recomendado por ninguém menos que o maior físico pós Einstein, Stephen Hawking, acerca do fenômeno da aleatoriedade. O autor ensina teoria da aleatoriedade no famosíssimo Instituto de Tecnologia da Califórnia, o Caltech, celeiro de cientistas premiados com o Nobel, e é autor de obras com consagrados físicos mundiais, tais como Stephen Hawking (“Uma Nova História do Tempo”) e Richard Feynman (“A Janela de Euclides” e “O Arco-Íris de Feynman”).
Em “O Andar do Bêbado”, Mlodinow demonstra, por a+b, que ao contrário do que se supõe, a grande maioria dos eventos são fruto de uma combinação de fatores em grande parte aleatórios. Os exemplos por ele elencados, minuciosos e contundentes. A análise, verossímil. As conclusões, pertinentes.
No final das contas, após a leitura do livro, que em certos largos trechos demanda um conhecimento mais profundo de matemática probabilística que poderão ser deixados de lado sem que se comprometa o entendimento do tema, o “coup de grace” é o seguinte: em qualquer empreendimento nosso, consciente ou inconsciente, não temos como saber, mesmo após todo os esforços, seja de planejamento, seja de realização, qual será o resultado; com certeza somente temos como saber que se não empreendermos, não conseguiremos.
Tudo isso em decorrência do fenômeno da aleatoriedade. Ou seja, o esforço desprendido ao longo dos anos pela grande maioria para chegar lá somente valerá a pena para muitos poucos, e graças a fatores que independem de suas vontades.
É por essa razão que o autor conclui: “(…) a habilidade não garante conquistas, e as conquistas não são proporcionais à habilidade”.
E remata: “Nas palavras de Thomas Watson, o pioneiro da IBM: ‘se você quer ser bem sucedido, duplique sua taxa de fracassos’.”
A questão é a seguinte; vale a pena tamanho sacrifício? Talvez seja por isso que no Livro do Eclesiastes O-Que-Sabe advertiu, logo no prólogo: “Que proveito tira o homem de todos os trabalhos com que se afadiga sob o sol?”
Honório de Medeiros é professor, escritor e ex-secretário da Prefeitura do Natal e do Estado do RN
0 comentários:
Postar um comentário