A maioria faz qualquer coisa por dinheiro
Por Danuza Leão
Como é incrível um restaurante de luxo; se for de alto luxo e em Paris, mais incrível ainda. Os garçons volteiam por entre os clientes e todos os desejos são realizados antes mesmo de sabermos que eles existem. Nesses ambientes, tem de tudo e não se espera por nada.
É uísque? Ok. De que marca? Copo curto ou longo? Gelo? E a água, é natural ou com gás? Pense: se seu amigo mais íntimo for visitar você, já percebeu quantas providências terá que tomar até que estejam os dois sentados conversando, botando a vida em dia?
Quando, enfim, conseguirem, ainda precisará limpar cinzeiros – isso sem falar no capítulo salgadinho e afins. Aí, realmente, é demais e, por todas essas razões, vamos voltar correndo aos restaurantes. Aliás, a um determinado restaurante, e em Paris, claro.
Foi assim: fazia frio lá fora, mas bastava entrar para nos sentirmos no paraíso. Em cima do balcão do bar, havia um imenso jarro com as flores mais lindas do mundo, de um tipo ao qual não estamos habituados, por não ter nada de tropical. O maître nos levou à mesa, e a sensação de felicidade só fez aumentar.
Depois de servidos os drinques, olhei em volta para reconhecer o terreno. Todos pareciam felizes, o que é sempre bom, mas me detive em uma mesa com dois casais. Não eram muito jovens nem muito bonitos, e um deles prendeu meu olhar.
Ele tinha entre 50 e 60 e não era nenhum galã. Com uma barba moderna, estilo malfeita, dava atenção especial à sua companheira. Ela não era inacreditavelmente bonita e teria o quê? Quarenta, 45? Bem, com as mulheres nunca se sabe. É certo que ele não parecia exatamente apaixonado, mas, de alguma maneira, dava para sentir que todas as outras não tinham a menor importância para ele; não naquela noite.
Ele ouvia o que ela dizia – ou melhor, escutava, o que é bastante diferente –, e com aquela atenção que raramente os homens dão. E tinha mais: de vez em quando, passava a mão no ombro dela com um ar de posse, uma firmeza daquelas que as mulheres adoram.
Ele não era maravilhoso, mas havia uma certa decisão no seu rosto, na sua expressão e, sobretudo, nas suas mãos, que não só eram lindas como também sábias.
Para entender melhor o clima: as toalhas eram rosa e havia velas nas mesas, o que fazia com que as mulheres parecessem deusas, e os homens… Nem vamos falar disso! Todos ali eram bonitos e glamourosos, assim como aparentavam não ter um só problema na vida e ser muito felizes. E achei, com certo pesar, que não pertencia àquele mundo.
Depois do ritual de praxe – champanhe, primeiro prato, segundo prato e o suflê da sobremesa, sabiamente encomendado no início da refeição –, veio o café. E, por uma dessas coincidências que ocorrem, as duas mesas (a deles e a nossa) se levantaram ao mesmo tempo e todos nos encontramos na calçada. Foi incrível.
O tal casal, longe das velas, das flores e da atmosfera, era apenas banal. Ele, o charmoso, era feio e deselegante e ela… Bem, um nada.
A barba dele, tão sedutora, não passava de barba malfeita, e aquela mão, tão carinhosa, estava prosaicamente tentando chamar um táxi. Ele foi andando para procurar outro carro, e ela ia atrás, se equilibrando no salto.
Nessa hora, entendi por que a maioria das pessoas faz quase qualquer coisa por dinheiro: para viver em lugares luxuosos, achando que a vida é sempre bela e todos são lindos e felizes.
A conta foi alta, mas valeu. Afinal, por duas horas de ilusão, se paga qualquer preço.
Danuza Leão é escritora e cronista
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