Bancos versus Dilma
Expansão do crédito:
Dieese aponta por que bancos privados estão arredios a Dilma
Instituições privadas seguem ideário da austeridade e cortam
oferta de empréstimos. Bancos públicos, por outro lado, ampliam carteiras duas
vezes mais rápido e já detêm 48,1% do mercado
Diego Sartorato
Não são apenas os partidos e candidatos que formulam
projetos a serem debatidos durante as campanhas eleitorais: organizações da
sociedade civil e entidades privadas também avaliam quais mudanças na condução
do poder público são necessárias para garantir o atendimento de interesses
singulares ou coletivos. Algumas dessas plataformas "setoriais" são
tornadas públicas, mas nem todas, especialmente quando se referem a interesses
empresariais, seja pelo sigilo do planejamento nos negócios, seja porque há
objetivos patronais inconfessáveis à opinião pública, a regra é que os
interesses econômicos de setores poderosos sejam discutidos privativamente.
Para as eleições presidenciais deste ano, porém, empresas do
mercado financeiro, central no capitalismo e no jogo político brasileiro,
romperam o silêncio habitual e têm tomado posição agressivamente contrária à
reeleição da presidenta Dilma Rousseff (PT). Nas últimas semanas, o banco
espanhol Santander divulgou análise em que previa cenário econômico negativo
caso Dilma se reeleja, mesma prática adotada por diversas consultorias que
atendem a investidores do mercado financeiro. Por meio de estudo encomendado ao
Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) e divulgado pela Folha de S.Paulo, o
setor chegou até a conferir valor concreto a cada ponto percentual perdido por
Dilma nas pesquisas eleitorais: seriam US$ 801 milhões a mais investidos em
ações de estatais a cada vez que a vitória da oposição se mostrasse mais
provável do que no levantamento anterior.
Um dos motivos para a campanha agressiva do setor
financeiro, como visto apenas às vésperas da primeira eleição de Luiz Inácio
Lula da Silva (PT), em 2002, está em estudo divulgado pelo Dieese sobre o
desempenho dos bancos em 2013. De acordo com o levantamento, Banco do Brasil e
Caixa Econômica Federal, ambos públicos, conquistaram 48,1% do mercado de
crédito no país no ano passado e seguem ampliando as carteiras de crédito em ritmo
duas vezes superior aos bancos privados nacionais (que detêm 38% das carteiras)
e três vezes superior ao crescimento das empresas estrangeiras (com 13,9% dos
contratos de crédito). Não conta, para o levantamento do Dieese, o BNDES que,
em 2013, investiu R$ 514,5 bilhões em consumo e infraestrutura.
As instituições públicas foram as principais responsáveis
pelo crescimento, entre 2002 e 2013, da relação entre volume de crédito e
Produto Interno Bruto (PIB). Há 12 anos, o crédito disponível no país somava
23,8% do PIB; hoje, são 55,8%. Entre 2008 e 2013, mudou também o perfil do
microcrédito: se há seis anos os pequenos empréstimos tinham 73% do volume
destinados ao consumo, em 2013 apenas 10% foram voltados a essa modalidade. Os
outros 90% foram empenhados em micro e pequenas empresas (MPEs), setor que mais
cria emprego e renda no Brasil – em 2013, de acordo com o Sebrae, 85% dos
empregos com carteira assinada foram abertos nele.
O momento e a motivação dos bancos públicos e privados são
bastante distintos: enquanto os primeiros seguem a diretriz do governo federal
de ampliar o acesso e baratear o crédito com o objetivo de fortalecer o poder
de consumo das famílias e evitar os piores efeitos da crise econômica mundial,
os bancos privados seguem a direção oposta. Demitem trabalhadores (foram 10 mil
dispensas em 2013) e ampliam taxas e juros para garantir a rentabilidade.
O Itaú, por exemplo, que teve o maior lucro da história do
sistema financeiro brasileiro no ano passado (R$ 15,6 bilhões), aumentou em
12,8% seus ganhos, principalmente por meio de cobranças de serviços e taxas. Já
o Banco do Brasil, por meio da ampliação de sua atuação no mercado, foi
relativamente mais bem-sucedido e aumentou o lucro líquido em 29,1% em relação
a 2012.
Desde 2008, quando os mercados de capitais se
desequilibraram nas potências econômicas, o Brasil aplica políticas
anticíclicas de incentivo ao setor produtivo e ao consumo, com manutenção de um
baixo índice de desemprego e intensificação da transferência de renda, solução
oposta à adotada pela zona do Euro e no campo de influência dos Estados Unidos.
Nesses países, houve corte de investimentos públicos e distribuição de pacotes
de amparo ao sistema financeiro. O FED, banco central norte-americano, por
exemplo, injeta US$ 75 bilhões mensais no mercado financeiro atualmente.
Os bancos brasileiros, que atuam nas mesmas linhas gerais de
suas contrapartes internacionais, parecem estar à espera do mesmo tratamento:
tanto Aécio Neves quanto Eduardo Campos, candidatos a presidente por PSDB e
PSB, sinalizaram ao setor financeiro que estão dispostos a tomar medidas
"impopulares" para a economia, eufemismo para reformas no sentido de
reverter a política focada na geração de empregos e maior aproximação com o
modelo econômico norte-americano.
Já os governos petistas, a partir de 2003, embora tenham
garantido lucros astronômicos ao setor (que foi de um lucro global de R$ 4,8
bilhões em 2000 para R$ 46,6 bilhões em 2010), tomaram decisões importantes
para que os bancos públicos fossem capazes de induzir e equilibrar o mercado
financeiro, e, para tanto, até impediram privatizações. Em 2008, o então
governador de São Paulo, José Serra (PSDB), colocou à venda o último banco
público do governo estadual, a Nossa Caixa. Luiz Inácio Lula da Silva, então em
seu segundo mandato como presidente, acertou a compra da empresa pelo Banco do
Brasil por R$ 5,3 bilhões. Em 2009, o Banco do Brasil pagou mais R$ 4,3 bilhões
por 50% do Banco Votorantim, em nova ação agressiva de tomada de mercado.
O estudo do Dieese aponta, como um dos indicadores do
sucesso da aposta no crédito, o fato de que 2013 registrou os patamares de
inadimplência mais baixos já observados, com média de 3% de compromissos
financeiros descumpridos por clientes de bancos privados e na casa de 1% entre
clientes de bancos públicos. O cenário é próximo do descrito pela presidenta
Dilma em pronunciamento para o 1º de maio de 2012, quando enviou recado
bastante direto para o sistema financeiro.
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