sexta-feira, 22 de junho de 2007

A VERGONHA DE SER HONESTO, SEGUNDO RUI BARBOSA

Outro dia estava no Orkut, no fórum de uma comunidade, quando li o desabafo de um internauta, indignado com os rumos do Brasil. Depois de citar vários crimes cujos autores ficaram (ou ficarão) impunes, indo de fraudes na Previdência até o recente assassinato do menino João Hélio, ele disse o seguinte:

"Errado sou eu que acordo às 04:30 da manhã para ir trabalhar, pago IPTU, CPMF, IPVA e outras merdas por aí. Bem feito pra mim, quem mandou eu ser honesto."

Imediatamente me lembrei de uma famosa citação de Rui Barbosa (1849-1923). Eu não tinha maiores informações sobre o contexto no qual a frase foi proferida, mas as palavras do imortal (ele presidiu a Academia Brasileira de Letras) foram estas:


"De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto."

Resolvi pesquisar na Internet e encontrei a Fundação Casa de Rui Barbosa, que possui vários textos completos do autor, disponíveis online. Lá, encontrei a transcrição do texto em questão, incluindo os apartes dos outros senadores, os gritos de "muito bem!" e os comentários da mesa diretora. Eis aqui o texto integral:




Rui Barbosa fez este desabafo em 17 de dezembro de 1914, ao defender seu Requerimento de Informações sobre o Caso Satélite. O Caso Satélite, segundo palavras do próprio senador, foi uma chacina de presos. A impunidade dos assassinos confessos, depois de quase 4 anos decorridos do crime, foi o que motivou Rui Barbosa a fazer o Requerimento. Eis uma descrição do fato e o motivo da solicitação de informações:


"Oito ou dez assassínios, praticados gratuitamente, estupidamente, covardemente, barbaramente, contra oito ou dez homens inermes, no convés de um navio mercante, durante uma expedição armada pelo próprio Governo, pelo agente da força pública a quem o Governo entregou a guarda, a segurança e a conservação desses mesmos homens.


Se, portanto, o Governo não queria o crime, se o Governo não é quem tinha autorizado esse crime, se o Governo sentia diante desse crime a repulsão que todos sentiram, não era lícito a esse Governo hesitar um só momento, em instaurar processo ao criminoso."


A seguir ele comenta que há um fato novo: um dos "assassinos confessos" alegou ser inocente e solicitou a instauração de um inquérito -- exatamente o que Rui Barbosa estava pedindo. Antes do desabafo anteriormente citado, ele diz:


"Se o Tenente Melo pede o Conselho de Guerra é porque tem consciência de possuir elementos com os quais julga poder estabelecer a sua defesa.


Ignoro qual seja, mas o que o público inteiro acredita e o que é lógico em face dessas circunstância, lógico, de uma lógica irresistível, é que o que se receia é a defesa do Tenente Melo, que o que se teme é que aquela boca se abra, é que aquele acusado se defenda. E se isso é o que se teme, é porque há grandes criminosos, criminosos maiores, cuja responsabilidade há grandes interessados em salvar."


A Chacina do Satélite ocorreu em 1914. Quase um século se passou e a impunidade no Brasil continua a mesma.















0 comentários:

Blog do Prof. Ozamir Lima - Designer: Segundo Freitas