domingo, 21 de outubro de 2012

Um jovem professor da rede pública interrompeu ciclo de poder em Apodi


O jovem professor Flaviano Monteiro teve a visão, no passado recente, que o povo de Apodi estava cansado da sequência interminável de políticos tradicionais no controle do município. Pensou que poderia conduzir o processo de mudança. Daí, através da luta nos movimentos sociais e com apoio imprescindível de personagens que pensaram como ele, construiu um projeto político que cumpriu todas as etapas antes de conquistar o Poder Municipal. Flaviano foi candidato a prefeito em 2008; perdeu, mas assustou os poderosos com a votação considerável. Dois depois, em 2010, se candidatou a deputado estadual  como “ponte” para as eleições 2012, e obteve uma votação surpreendente no município, com mais de 11 mil votos. Com a boa performance eleitoral, chegou forte na disputa deste ano. A confirmação veio nas urnas: Flaviano venceu a prefeita Goreti Pinto por uma maioria de quase 3 mil votos; e, por gravidade, determinou a aposentadoria do ex-prefeito José Pinheiro Bezerra, que na reta final da campanha retirou a própria candidatura para se unir à tradicional família Pinto. Quando assumir a Prefeitura no dia 1º de janeiro de 2013, Flaviano Moreira Monteiro, 40 anos, filiado ao PC do B, estará interrompendo uma sequência de 20 anos do PMDB no Poder Municipal. Mais do que isso: implantará um novo modelo de gestão pública, conforme prometeu em praça pública, bem diferente do perfil tradicional e saturado que funcionava há duas décadas. Flaviano é professor de História na escola pública, formado pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), com especialização em História do Brasil. Ele colocará comunidade de Santa Rosa, onde nasceu, de volta a Prefeitura, depois de 30 anos do conterrâneo Valdemiro Pedro Viana ter administrado Apodi. Flaviano tomou o “Cafezinho com César Santos”, oportunidade em que contou como pretende promover a grande mudança no município do médio-oeste. As fotos são de Jotta Paiva. Leia:


O sr. se elegeu prefeito derrotando a essência da política tradicional de Apodi. Também interrompeu um ciclo de 20 anos do PMDB no Poder, com discurso da nova geração e de filiado do PC do B. O sr. acredita que a sua vitória iniciará uma nova fase da política apodiense?
Vai mudar, não tenha dúvida. Apodi deu uma resposta contundente aos tradicionais. Com voto decidiu pela mudança. Acaba um ciclo de 20 anos de dominação do PMDB em Apodi (1992, com eleição do prefeito José Pinheiro e 2012 com o fim do governo da prefeita Goreti Pinto), que já mostrava-se saturado. O povo do Apodi apostou no projeto de mudança que nós construímos muito antes da campanha eleitoral deste ano. Esse processo foi iniciado em 2008 quando eu fui candidato pela primeira vez, representando os anseios do que esperavam por mudanças. Agora, esse projeto deu um passo importante, que foi a conquista da Prefeitura. Nós vamos mudar a política-administrativa do Apodi porque é uma necessidade urgente e anseio da população. Temos agora o compromisso de concretizar esse projeto na prática; é o que o vamos fazer.

Além de interromper  um ciclo de 20 anos das forças tradicionais, a sua vitória nas urnas foi histórica também em números, com uma maioria acachapante. Evidentemente, a responsabilidade se torna ainda mais. Diante desse quadro, o sr. se sente preparado para corresponder as expectativas do povo?
Estou preparado, mas esse julgamento só será feito daqui a quatro anos, ao final da nossa administração. Ao longo da minha história de vida, como estudante, depois professor e militante de movimentação social, a gente se preparou muito para esse momento. Eu estou preparado para conduzir a nossa cidade para um futuro melhor. Vamos colocar em prática o nosso discurso de campanha, com muito trabalho, responsabilidade e honestidade. Entendo que o povo me deu um cheque em branco; os que votaram em mim e os que não votaram também. Entrei em mais de sete mil casas, levando a palavra de mudança, pedindo um voto de confiança. Agora, posso assegurar, não decepcionarei. No entanto, o julgamento da nossa gestão que vai fazer é o povo da minha cidade daqui a quatro anos.

O sr. foi eleito com o discurso do novo, mas recebeu apoio de grupos e políticos tradicionais, que ajudaram a construir o modelo que aí está. O sr. acha que é possível construir um novo perfil de gestão com políticos de práticas convencionais?
Eu entendo que é possível. A nossa coligação, inicialmente, foi formada por cinco partidos (PC do B, PSB, PSD, PDT e PSDB) e parte dos políticos tradicionais não estava com a gente; eles chegaram com a retirada da candidatura do ex-prefeito José Pinheiro (PR).  A gente ampliou o arco de aliança, mas sem afetar a nossa proposta de governo. Eu entendo que agimos corretamente. Serei gestor de uma cidade de porte médio e preciso governar para todos. Não cabe mais fazer política com radicalismo; com aquele jeito antigo de dizer que não quero político tal perto de mim. Entendo que todos nós temos algo de bom a oferecer. Então, o projeto vencedor foi o da nova geração, do novo modelo de gestão, e cada um que participou da luta vai dá a sua colaboração respeitando a mudança aprovada pelo povo. Vamos trabalhar com os partidos e os políticos que construíram a nossa vitória, mas sem abrir mão do novo jeito de administrar. Essa responsabilidade é de todos; eu serei apenas o condutor.
Como o sr. espera a transição de governo? Há clima para um trabalho harmonioso com a prefeita derrotada Goreti Pinto?
A prefeita Goreti ganhou da gente em 2008 e não houve da nossa parte uma reação radical. Fizemos oposição durante quatro anos, mas sempre respeitando a pessoa da prefeita. Posso dizer que tivemos uma relação amigável. Somos adversários políticos; não somos inimigos. Já conversei com a prefeita, através de uma ligação telefônica. Disse que queríamos uma transição tranquila, sem transtornos ou qualquer tipo de comportamento radical. Ela é prefeita até 31 de dezembro e nós vamos respeitar o seu mandato. Goreti é consciente de suas responsabilidades, portanto, não creio que enfrentaremos algum tipo de problema no processo de transição.

Essa será a sua primeira experiência em gestão pública. Do discurso a prática existe uma distância. É possível afirmar com a garantia que as mudanças serão feitas?
Nós vamos colocar em prática o que foi prometido, não tenha dúvida. Estamos prontos e preparados para o desafio. Agora veja bem: as mudanças serão feitas sob o ponto de vista administrativo. O modelo que aí está foi reprovado nas urnas. Então, não podemos decepcionar o povo que creditou a confiança com o voto. Sabemos, porém, que o grande desafio será resolver as dificuldades que o município enfrenta. Problemas crônicos que afetam as pessoas precisamos ser resolvidos com coragem. Prometemos isso em praça pública e vamos cumprir. É o que o povo espera da nossa gestão; vamos corresponder com trabalho.

O sr. já imagina de que forma essas mudanças serão encaminhadas e concretizadas?
Vamos  falar das coisas mais urgentes que precisam ser feitas. Inicialmente vamos fazer o básico, que é resolver os problemas mais urgentes e devolver o bom funcionamento da máquina. Isso é o básico. Nada de inventar, uma vez que é preciso apenas colocar a estrutura para funcionar, principalmente nos setores vitais do serviço público como saúde e educação. Resolvido isso, partiremos para planejar com a população as obras estruturantes que possam promover a qualidade de vida do nosso povo. Vamos fazer isso sem ansiedade, com muito calma, de forma planejada, para que as coisas possam acontecer. Posso adiantar que a sociedade apodiense será convocada a construir o novo modelo. Daí, promoveremos um choque de gestão para proporcionar a realização de um governo diferente.

Esse choque de gestão, como o sr. pretende executar?
A partir da formação de nossa equipe de auxiliares. Vamos convocar para as secretarias os profissionais das áreas específicas. Evidentemente, respeitaremos os critérios técnicos e políticos. O importante é formar um secretariado com o perfil que se aproxima do novo modelo de gestão inserido em nosso plano de governo. Vamos otimizar os recursos e humanizar o atendimento nas repartições públicas, que hoje é bastante reclamado pela população. Vamos colocar os bons programas para funcionar. Apodi tem hoje alguns programas bancados pelo Governo Federal que não funcionam. É um absurdo.  Vamos corrigir isso. Creio que a partir desses pontos importantes é possível promover o choque de gestão, transformando o perfil da administração pública.

O sr. tem valorizado a participação da sociedade. Isso, por si só, já representante mudança de mentalidade do gestor público. Porém, não é temerário transferir responsabilidade quando, no fundo, a população espera do prefeito a solução dos problemas?
Apodi é uma cidade muito organizada sob o ponto de vista de mobilização dos segmentos da sociedade. Temos entidades de todos os níveis. Creio que a sociedade organizada pode ser um parceiro importante da nossa gestão. Temos uma zona rural muita extensa, onde as associações desenvolvem um trabalho reconhecido. Então, como prometemos em praça pública, vamos convocar a sociedade organizada, através das entidades de classe, sindicatos, associações, para discutir o nosso plano de governo. Essa é a importância que vejo em projetar uma gestão com a participação popular. O prefeito tem a responsabilidade de conduzir o processo, de administrar a cidade, mas não pode abrir da participação da sociedade organizada.

Diante do novo modelo que o sr. propõe, de que forma as prioridades serão  definidas e trabalhadas?
Depois de organizar a casa, equilibrar as finanças, otimizar a máquina e humanizar o serviço público, partiremos para realizar as grandes obras estruturantes. Daí, definiremos as prioridades. Por exemplo: nós queremos chegar ao Fórum da Agricultura Familiar, que representa o segmento rural, e discutir as melhorias para as comunidades. Se a gente estabelecer um debate aberto e franco com a sociedade, é possível conseguir avançar sob o ponto de vista administrativo. É uma coisa nunca antes vista em Apodi. Daí, partiremos para viabilizar a realização das prioridades elencadas por todos. Sabemos que a Prefeitura não tem recursos financeiros para construir as grandes obras, por isso, vamos buscar as parcerias com os governos estadual e federal , organismos públicos e a iniciativa privada. É possível criar um cinturão de parceiros como Petrobras, Fiern, Sabrae, Incra, entre outras instituições. É isso que vamos fazer.

Há uma necessidade urgente de melhorar as condições nos assentamentos da Chapada do Apodi. O sr. assumiu compromissos com essa área. Como pretende cuidar das famílias que sofrem nos assentamentos por falta de assistência?
Esse é um problema que precisa de solução urgente. A Chapada do Apodi tem mais de 20 assentamentos. Vamos sugerir parceria com o Incra, mas sem abrir mão de chamar a responsabilidade de cada um. Vamos discutir com a base, com os assentados, para definirmos as prioridades. Por exemplo: nós moramos numa bacia calcária, mas, infelizmente, nós não temos um assentamento da Chapada do Apodi que seja pavimentado. É difícil pavimentar esses assentamentos? Acho que não. A pedra está lá, o assentado produz a pedra e tem disposição de trabalhar. O que falta? Projeto, parceria. É isso que vamos fazer. Vamos propor parceria com o Incra para solucionar esse problema. Poderemos perfeitamente chamar a Petrobras para uma parceria maior. Quem sabe, transformar os royalties em obras importantes para Apodi.  Para beneficiar a cidade e a zona rural. Veja que a Petrobras paga os royalties, é bem verdade, mas as consequências ambientais que fica para futuras gerações do Apodi ninguém sabe calcular. Então, porque não discutir ações para melhorar a qualidade de vida das pessoas que vivem em áreas onde a Petrobras explora a extração de petróleo? É isso que os governos passados deveriam ter feito, mas nós vamos fazer agora.

O sr. já tem em mente um grande projeto que possa alavancar o desenvolvimento de Apodi?

O nosso plano de governo tem um conjunto de metas que contempla todas as áreas. Alguns projetos vejo como importantes. Por exemplo: temos o projeto de implantação de um parque industrial. Vamos buscar a parceria com a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (FIERN). O vice-presidente da entidade é filho de Apodi, o empresário Pedro Terceiro de Melo, que também é diretor-presidente da Companhia Docas do Rio Grande do Norte (CODERN). É uma força que tem a nosso favor; a favor de Apodi. A Fiern  pode ser um grande parceiro, então, vamos atrás, apresentar projetos, lutar para que a cidade possa receber obras importantes. Sei que enfrentaremos algumas resistências. Sei que as dificuldades existirão. Mas também sei que é possível fazer muito por Apodi. Não vou dizer aqui que resolveremos todos os problemas de Apodi em quatro anos de gestão. Isso é impossível. Os problemas são muitos, principalmente na saúde, na educação e na área de moradia. A cidade tem um grande número de casas de taipas. Durante a campanha eleitoral, encontrei uma senhorinha de 96 anos morando numa tapera; isso é inconcebível. Vamos lutar para reverter esse quadro. Garanto que o que estiver ao nosso alcance será feito. Os caminhos Deus vai mostrar e nós vamos seguir com muito disposição e determinação.

O projeto da Chapada do Apodi dividiu opiniões e criou um quadro de incerteza nos assentamentos rurais. Mas o Governo Federal acelerou o processo para realização da obra. Qual a sua posição em relação ao projeto?
Esse é um projeto que ainda vai nos preocupar muito porque há uma divisão sem volta. Um grupo que está contra, não muda de posição; a mesma coisa com o grupo que é favor.  Acho que a forma como o projeto foi elaborado é que criou essa divisão. O Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra a Seca) tem um histórico de elaborar projetos e executar obras sem consultar o povo. Isso é um erro gigantesco.  Quero lembrar a nossa luta pela irrigação do Vale do Apodi. Organizamos um Fórum com a participação de várias entidades, inclusive essa luta foi acompanhada de perto pelo Jornal de Fato, e conseguimos  um projeto através do Governo do Estado de irrigação de três mil hectares no vale. Dentro dessa ação tem um projeto piloto que leva água através de duto, a partir da parede da barragem, para beneficiar 116 famílias residentes às margens do rio Apodi/Mossoró, entre as cidades de Apodi, Caraúbas e Felipe Guerra. Esse projeto foi discutido através das entidades, com a participação direta da população. Deu certo. Já o projeto da Chapa do Apodi não foi colocado em discussão. O Dnocs decidiu e pronto. Criou-se um conflito de difícil solução. Como gestor público eu vou ouvir todas as partes envolvidas; daí, buscar o entendimento, resguardando sempre o que for melhor para os filhos da nossa cidade. Essa é a discussão que pretendemos conduzir com tranquilidade, equilíbrio e deixando a emoção de lado. Daí, creio, será possível encontrar uma solução.

Ainda há tempo para modificar o projeto?
Tem um movimento muito forte conduzido por trabalhadores e trabalhadoras rurais, que lutam pela modificação do projeto. Particularmente eu acho que o tempo está curto. O Dnocs avançou muito com processo licitatório e outros trâmites legais. No entanto, eu continuo defendendo que é preciso ouvir todos os segmentos que serão alcançados de uma forma ou de outra. Hoje a minha responsabilidade é muito maior. Como gestor público tenho a responsabilidade  de conduzir o processo do diálogo, sempre defendendo o que é melhor para os filhos e filhas de Apodi. E assim farei.

César Santos Jornal de Fato

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