sábado, 20 de julho de 2013

A insustentável herança maldita

Por Arnaldo Jabor*
O que aconteceu com este governo foi mais um equívoco na história das trapalhadas que a esquerda leninista comete sempre, agora dentro do PT. O fracasso é o grande orgulho dos revolucionários masoquistas. Pelo fracasso constrói-se uma espécie de “martírio enobrecedor”, já que o socialismo hoje é impossível.
Erraram com tanta obviedade (no mensalão por exemplo ou no escândalo dos “aloprados”), com tanto desprezo pelas evidências de perigo, tanta subestimação do inimigo, que a única explicação é o desejo de serem flagrados.
Conheço a turminha que está no poder hoje, desde os idos de 1963, e adivinhava o que estava por vir. Conheci muitos, de perto. Nos meus 20 anos, era impossível não ser “de esquerda”. Nós queríamos ser como os homens heroicos que conquistaram Cuba, os longos cabelos de Camilo Cienfuegos, o charuto do Guevara, a “pachanga” dançada na chuva linda do dia em que entraram em Havana, exaustos, barbados, com fuzis na mão e embriagados de vitória.
A genialidade de Marx me fascinava. Um companheiro me disse uma vez: “Marx estudou economia, história e filosofia e, um dia, sentou na mesa e escreveu um programa racional para reorganizar a humanidade.” Era a invencível beleza da Razão, o poder das ideias “justas”, que me estimulava a largar qualquer profissão “burguesa”.
Em vez do charme infinito dos cubanos, comecei a ver o erro, plantado em duas raízes: ou o erro de uma patética organização estratégica que nunca se completava, ou a “margarida que apareceu” agora com todo esplendor: a Incompetência (com ‘i’ maiúsculo), a mais granítica, imaculada incompetência que vi na vida.
Como era fácil viver segundo os escassos “sentimentos” catalogados pelos comunas: ou o companheiro estava sendo “aventureiro” ou “provocador” ou então era “oportunista, hesitante, pequeno-burguês” ou sectário ou “obreirista” ou sei lá o quê. Era fácil viver; ignorávamos os ignorantes, os neuróticos, os paranoicos, os psicopatas, os burros e os sempre presentes filhos da puta.
E veio a sucessão de derrotas. Derrota em 64, derrota em 68, derrota na luta armada, derrotas sem fim. Até que surgiu, nos anos 70, uma homem novo: Lula, diante de um mar de metalúrgicos no ABC. Aí, começou a romaria em volta da súbita aparição do messias operário, o ungido. Lula foi envolvido num novelo de ideologias e dogmas dos comunas desempregados, desfigurando de saída o que seria o PT.
Quando comecei a criticar o PT e o Lula, “petralhas” me acusaram de ser de direita, udenista contra operários. Não era nada disso; era o pavor, o medo de que a velha incompetência administrativa e política do “janguismo” se repetisse no Brasil, que tinha sido saneado pelo governo de FHC. Não deu outra.
O retrocesso foi terrível porque estava tudo pronto para a modernização do país; mas o avião foi detido na hora da decolagem. Hoje, vemos mais uma “revolução” fracassada; não uma revolução com armas ou com o povo, mas uma revolução feita de malas pretas, de dinheiro subtraído de estatais, da desmoralização das instituições republicanas.
Hoje, vemos o final dessa epopeia burra, vemos que a estratégia de Dirceu e seus comparsas era a tomada do poder pelo apodrecimento das instituições burguesas, uma espécie de “gramscianismo pela corrupção” ou talvez um “stalinismo de resultados”.
O perigo é que os intelectuais catequizados ainda pensam: “o PT desmoralizado ainda é um mal menor que o inimigo principal – os tucanos neoliberais”. Como escreveu minha filha Juliana Jabor, mestra em antropologia, “ajudado por intelectuais fiéis, Lula poderá se apropriar da situação com seu carisma inabalável, para ocupar a ‘função paterna’ que está vaga desde o fim do seu governo. Pode ser eleito de novo e a multidão se transformará, aí sim, em ‘massa’. O ‘movimento’ perderá o seu caráter de produção de subjetividades e se transformará numa massa guiada por um líder populista.” (*Leia a íntegra do artigo de Arnaldo Jabor em O GLOBO)

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