segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

Internet para quem não pode ver: conheça o trabalho do Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do RN

POR LÁYRON SALES e LUCAS OLIVEIRA*
*Reportagem realizada como atividade prática da disciplina 'Introdução ao Jornalismo', com coordenação das Profªs Erika Zuza e Socorro Veloso, curso de Jornalismo na UFRN - 2013.2.
A professora de Informática do Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do Rio Grande do Norte (IERC-RN), Ângela Rodrigues de Araújo, 45, explicou como é o processo de aprendizagem de um deficiente visual quando o assunto é informática. O trabalho começa com o aprender a usar o corretamente o computador, desde ligá-lo e desligá-lo com segurança, acessar o Dosvox e conhecer as ferramentas que o programa dispõe. “Nós pegamos esse material que eles aprenderam a usar e transformamos em projetos como o IERC em Notícias, que é um jornal informativo produzido pelos alunos que aprenderam a digitar e pesquisar e divido em grupos por afinidades, como esporte, cultura, lazer e cada grupo vai elaborar o material. Eu corrijo e esse material é interno, apenas para a instituição”, diz.
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Atualmente o projeto “IERC em Notícias” está parado devido aos custos de impressão, já que três folhas normais transformadas em Braille viram 15, por exemplo. “Outro projeto que foi muito positivo foi o livro ‘Histórias de vida real além do que os olhos podem ver’. À medida que eles foram aprendendo a digitar, cada um foi digitando a sua história de vida, contando como perdeu a visão, como se sentiu, como está hoje e o que eles pretendem para o futuro. Então eu peguei essa coletânea e montamos o livro”. A professora acredita que a maior dificuldade em trabalhar com deficientes visuais hoje é o “tocar” ou aceitar o “toque”, porque, segundo ela, eles precisam ter a visão através das mãos.
Já Jessé José de Araújo, 32, aluno do IERC-RN, disse que muitas pessoas desenvolvem sites e não os deixam acessíveis para um deficiente visual, por colocarem muitos ícones, desenhos sem porem a descrição do que aquela imagem representa. O programa leitor de telas não lê imagens, somente texto. Há, porém, um atributo que se pode colocar numa imagem que consiste na sua descrição, funcionando de forma semelhante a uma legenda. Jessé citou como exemplo a página de inscrição de cursos da COMPERVE (Núcleo Permanente de Concursos da UFRN). “A gente abre lá e só diz ‘Edição’, em branco, mas não tem dizendo se é ‘Identidade’, ‘CPF’, ‘endereço’… O formulário está lá, mas a gente não sabe. O programa fica cego”.
Porém, o aluno do IERC, que usa prioritariamente o leitor de telas NVDA e acessa a internet há mais ou menos três ou quatro anos, afirmou que consegue ler sites de notícias e acessar o Google, para fins acadêmicos. “Como eu estudo, eu dependo dela”, declara, referindo-se à internet. Quanto às redes sociais, ele contou que é possível acessar, mesmo que elas deixem a desejar em alguns links.
Mas nem todos os deficientes visuais ainda estão dentro do grupo que consegue acessar a rede mundial de computadores. O aposentado Pedro Marcelino Vieira, 64, que também é aluno do IERC, afirmou que ainda está engatinhando no uso de computadores com o leitor de telas. Ele declarou que não acessa a internet ainda, mas já consegue fazer algumas coisas no computador, como uma autobiografia que começou a escrever. “Minha dificuldade é que eu ainda tinha um pouco de visão. Eu tinha dificuldade em identificar as telas, mas hoje eu já estou identificando melhor”, conta.
O aposentado, que gostaria, dentre outros, de ter uma conta na rede social Facebook, sente que está perdendo contato com o mundo por não saber usar a internet com um leitor de telas. “Está existindo dentro de mim uma necessidade de me comunicar com o mundo. Eu estou ficando analfabeto porque estou fora da internet. O meu objetivo é ter aulas de computação para que comece a me comunicar. Eu estou ficando isolado do mundo, porque estou perdendo a visão, só uso meu celular, e ainda não sei usar a internet, vou aprender, vou comprar um computador para me comunicar com o resto do mundo”, desabafa.
São 186 deficientes visuais atendidos pelo Instituto
No IERC-RN, instituição filantrópica que atende atualmente 186 deficientes visuais, são desenvolvidos trabalhos de orientação à mobilidade, música, informática, escrita cursiva, Braille, psicomotricidade, estimulação essencial, entre outros. A diretora-administrativa do instituto, Gleide Dias de Medeiros, 66, nos conta que ela foi a primeira estimuladora de bebês deficientes visuais no estado. “Quando uma criança é acompanhada desde os três ou quatro meses de vida, você vai trabalhar tanto a criança quanto a família e ela tem seu desenvolvimento normal. Mas quando a criança não passa por esse acompanhamento, ocorre um atraso no desenvolvimento, os pais acabam isolando a criança”, conta. Gleide é categórica ao dizer que cobra tantos dos alunos quanto dos pais que eles estudem para viver a vida deles e sejam bem sucedidos. “Muitos terminam seus estudos e querem ficar por aqui, mas eu digo ‘reabilitou-se? Vá fazer uma faculdade’”. Um grupo que chegou há pouco tempo no instituto já fez a prova do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
O repórter Lucas Oliveira passou pela experiência de manusear o computador como um deficiente visual. Como não tinha venda para pôr nos olhos, ele fez a experiência de olhos fechados, orientado pela professora Ângela Araújo. O primeiro passo foi ligar o estabilizador e a CPU do computador, em que, através do tato, nosso repórter foi buscando os botões corretos. Usando a audição, percebeu quando o sistema operacional do computador já estava pronto para uso.
A professora, então, o ensinou a iniciar o leitor de telas Dosvox para, em seguida, começar a usá-lo. A primeira tarefa foi a de identificar teclas do computador. Em seguida, ele escreveu no Edivox, o editor de textos do Dosvox. Entre erros e acertos, tateando o teclado de acordo com as instruções da professora de informática, o repórter conseguiu primeiro escrever o próprio nome e, em seguida, a frase “estou usando o dosvox”.

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