terça-feira, 22 de setembro de 2009

Manifestações estão banalizadas

Protestos acontecem quando governo não quer discutir exigências da categoria

Quem não está acostumado a ver ou ouvir notícias sobre um novo protesto que acontecerá em Natal ou no interior? Quase todos os dias a imprensa noticia alguma nova manifestação sindical no Rio Grande do Norte. Depois que a classe trabalhista brasileira adquiriu o direito de reivindicar pelos seus direitos, os atos públicos ficaram mais acessíveis para as categorias, principalmente do serviço público. No entanto, essas manifestações caíram na rotina dos sindicatos e estão cada vez mais banalizadas. Grande parte desses movimentos já não conta mais com a adesão nem dos trabalhadores.

Atos públicos, acampamentos, piquetes, passeatas, paralisações e greves. As manifestações têm como objetivos principais pressionar o governo para que as reivindicações sejam negociadas e avisar à sociedade que a categoria está insatisfeita com a situação atual e que uma possível greve está por vir. Geralmente, os protestos acontecem em duas situações: quando o governo nem quer discutir as exigências da categoria, ou quando a audiência acontece, mas não atende às expectativas dos trabalhadores.

O tipo de manifestação pode ser diferente, as reivindicações podem não ser as mesmas, mas as classes trabalhistas estaduais e municipais usam o mesmo argumento: “quem decide a ação do sindicato é o governo e os gestores estão cada vez mais fechados para negociar com os servidores públicos”. E sendo os atos públicos a forma mais fácil e banal de protesto, é comum ver a participação apenas da diretoria do sindicato. São montadas as tendas, pregadas as faixas, ligado o carro de som e os microfones estão a postos, mas os que supostamente estariam mais interessados nisso não comparecem.

O Sindicato dos Servidores da Administração Indireta (Sinai), por exemplo, tem uma tradição que mantém firme todo início de ano: já no dia que entregam a pauta de reivindicações para o Governo, realizam uma caminhada, que termina num ato público. “Nós já temos que agir assim porque conhecemos o histórico desses governantes. Eles não querem nos receber, se não fizermos de um jeito que chame atenção, eles não vão nem ler os documentos. Um secretário já chegou a me dizer que o Governo só se interessa pela negociação quando vê que o serviço foi parado e a população está reclamando”, afirmou a vice presidente do Sinai, Maria Sineide.

Apesar de tanto movimento, os sindicalistas garantem que só recorrem a esse meio quando esgotam todas as vias negociação com os governantes. “Nós sempre procuramos o Governo primeiro, entregamos a pauta com as reivindicações, pedimos reuniões, audiências para discutir essas propostas. Quando eles não aceitam e nós vemos que eles podem fazer mais, aí nós partimos para o protesto”, disse Fátima Cardoso.

Para a presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Natal (Sinsenat), Soraya Godeiro, é preciso saber o momento certo para fazer uma manifestação. “Para chamar um ato público, ele tem que ser muito bem chamado, as categorias precisam estar engajadas nas reivindicações, senão o tiro sai pela culatra”. Já para a coordenadora geral do Sindicato dos Trabalhadores da Educação no RN (Sinte), Fátima Cardoso, os atos públicos pontuais são guiados pelo sentimento da diretoria dos sindicatos.

Outros sindicatos que estão sempre no foco da mídia são: o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde do Estado (Sindsaúde), Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgotos e Meio Ambiente (Sindágua), Sindicato dos Tabalhadores dos Correios (Sintect), Sindicato dos Servidores Públicos Federais em Saúde, Trabalho, Previdência Social e Ação Social (Sindprevs), Sindicato dos Bancários (Sindbancários).

Sindsaúde recordista dos atos públicos

Todos reconhecem os problemas que rondam a saúde pública no Rio Grande do Norte. Faltam profissionais, equipamentos, materiais, comprometimento dos gestores públicos e uma série de outras coisas. No entanto, o Sindicato dos Trabalhadores da Saúde do Estado (Sindsaúde) parece ser o recordista das manifestações populares. Só esse ano, a diretoria do Sindicato estima já ter realizado 50 atos públicos no RN.

Apesar de tantos protestos, a presidente do Sindsaúde, Sônia Godeiro, afirma não temer que as manifestações fiquem banalizadas. “Os atos públicos sempre vão ter sua importância de denúncia para a opinião pública. Não temos a menor preocupação de que isso se torne um ato banal porque é uma manifestação rápida de se fazer e, por ter repercussão na imprensa, é uma forma de pressão para o poder público”, disse.

Mas o esvaziamento das manifestações, principalmente aquelas pontuais, continua cada vez mais notório. Com tantos protestos para participar, é preciso que os próprios sindicalistas e a classe trabalhista selecionem aquelas que consideram mais importantes e que atendem diretamente aos seus interesses. Outros preferem cuidar primeiro dos problemas pessoais. É o caso de Yara Cordeiro, filiada ao Sinai, que esse ano ainda não compareceu a nenhuma manifestação. Apesar de reconhecer a excessiva frequencia dos atos públicos no Estado, ela garante que não deixou de ir por motivos de cansaço. “Dependendo do motivo de ato público, quem está interessado não se cansa. Mas às vezes, a manifestação não é do interesse de todos, e no caso do Sinai, que tem várias entidades filiadas, as categorias são diferentes entre si, umas são mais organizadas, umas se mobilizam mais, outras menos, alguns esperam o diretor resolver o problema. Eu não pude ir a nenhum protesto esse ano, porque estou com outros problemas mais sérios para resolver. Temos que arrumar primeiro nossa casa”, disse Cordeiro.

Quanto à presença de cada vez menos pessoas nas manifestações, ela alega dois motivos: a falta de tempo para avisar a todos os sindicalizados e a desilusão de alguns trabalhadores.

Sindicatos têm lutas políticas e não são neutros

Política é agir e falar no espaço público, como forma de ampliar uma denúncia sobre determinados fatos que ferem interesses próprios ou coletivos. Diante disso, qualquer ato público se transforma num ato político, independente de estar ligado a algum partido ou gestor público. Apesar de o Estatuto dos Sindicatos proibir a filiação partidária, grande parte dos membros está ligada a algum setor político.

A presidente do Sindsaúde, Sônia Godeiro, admitiu que o Sindicato tem direcionamentos políticos de esquerda e reconheceu que a maioria das organizações segue linhas de direita. “Os membros do sindicato podem ser filiados a que partidos quiserem, muitos são de partidos diferentes e muitos nem querem falar de política. Mas o Sindicato tem lutas políticas sim, não é neutro, não é apartidário”.

Entretanto, o sindicato não expressa a vontade de todos os trabalhadores a ele filiado. O cientista político Lincoln Morais se desfiliou da Adurn por discordar da nova gestão. Antigo diretor do Sindicato, presidente do comando de greve, ele diz sempre ter apoiado os movimentos. “No Brasil, as estruturas estão muito rígidas. Para mudar isso, são necessários os movimentos de massa. Hoje, nós vemos um ato aqui, outro ali, mas não existe mais uma coordenação geral que unifique todos esses movimentos e articule um protesto com o outro. Por trás de tudo isso, ainda existe a questão dos partidos políticos”, disse.

Na paralisação dos serviços, população é a maior prejudicada

Para muitos, o protesto é um jogo de força entre trabalhadores e governo para mostrar quem cede mais e quem ganha menos. No entanto, na maioria das vezes, a população é a maior prejudicada com a paralisação dos serviços, ocupação de prédios, interdição de ruas. Para o sindicalista e cientista social João Bosco Araújo, alguns não aceitam menos do que querem. “Nem pode ganhar tudo, nem perder tudo. Os dois lados vão cedendo conforme as negociações vão acontecendo”, acredita.

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por exemplo, costumava ser palco freqüente dos noticiários locais em decorrência das comuns manifestações e constantes greves realizadas pelos professores. Há sete anos, entretanto, o corpo docente da UFRN não faz uma greve. De acordo com o presidente da Associação dos Professores da UFRN (Adurn), João Bosco Araújo, houve uma mudança radical na forma de gerenciamento da categoria.

“Para a Adurn, é legítimo recorrer a formas de pressões mais fortes como os protestos. Mas nas nossas últimas gestões, temos privilegiado um processo intenso de negociação, apostamos muito nas conversas. Todos podem dizer que tentam negociar primeiro, mas dependendo da concepção da diretoria do sindicato, isso pode se concretizar ou não”, disse.

Apesar de reconhecer que a atitude do Governo é que decide a atitude do Sindicato, João Bosco acredita que muitos sindicatos, por ainda serem ligados a partidos políticos fundamentalistas, privilegiam o conflito. “Os fundamentalistas tendem a se reduzir naquela visão fechada do que eles acreditam do mundo. No caso político, os grupos são de extrema esquerda ou extrema direita, são aquelas pessoas mais radicais, que tudo enquadram numa visão ideológica. Se a diretoria daquele sindicato for ligada a um partido ou a uma pessoa assim, eles vão privilegiar mais o conflito mesmo”, explicou.

Priscilla Castro - Repórter-tribuna do norte

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